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2012, para nós do artesanato de rua de
SP, artistas e artesãos que não conseguem espaços em feiras de jeito nenhum e que
portanto não tem a permissão da Prefeitura para trabalhar
legalmente em nenhuma parte da cidade, foi um ano muito ruim, como
estar em um outro tempo,outro país, nas épocas de perseguições,
ou até mesmo na época da Ditadura Militar. Tivemos um Prefeito
ditador, péssimo paras as questões sociais, para as artes de rua.
Muitas vezes quando não havia lugar para trabalhar, nenhuma
possibilidade de melhora e eu tinha que escapar da Policia pra
tentar a sobrevivência, garantir o minimo, eu lembrava cenas de
terror, de filmes que assisti sobre a época do nazismo, onde quem
saiu vivo teve que lutar muito e fazer”magica” para não ser
pego. Claro que o que aconteceu com os artesãos aqui em SP comparado
ao sofrimento e aos massacres durante a segunda guerra mundial não é
nada, nem uma garoa fina comparado com aquilo , mas foi um ano muito
pesado com um Prefeito tratando tudo o que ele considerava ilegal e não conhecia como caso de policia. Mesmo na
rua Augusta, reduto alternativo, underground, a coisa era pesada, com
a GCM e a PM fazendo rondas e terror pra cima de quem tentasse vender
alguma coisa. Fora isto tivemos que brigar pelo espaço que
improvisamos, um degrau de uma loja, quando fechava, com grupos de
ambulantes, “zumbis”, moradores de rua e até outras coisas mais
pesadas na madrugada
Ultimo dia do ano, nas ruas as pessoas
já estavam no espirito de virada de ano, com muitas festas. Eu não
sabia o que ia fazer no dia 31, principalmente por não ter dinheiro
algum, apenas para o básico. Fui convidado para uma festa na casa de
familiares e a outra opção seria ouvir fogos e gargalhadas das
festa dos outros, os vizinhos. Já passei esta data de varias formas,
festa de família, no meio de multidões de branco na beira da praia
desviando a cabeça pra que um rojão não me acertasse, tocando
violão perto da fogueira em Jericoacoara ou mesmo dormindo. Um ano
que passei em Fortaleza na beira mar no meio de milhares de pessoas
empolgadas, a minha namorada na época me perguntou o que eu ia fazer
quando o ponteiro do relógio desse inicio ao novo ano; Eu disse que
nada e depois fiquei pensando nesta coisa, da expectativa, da
loucura, sair gritando, buzinando, nadar pelado no lago gelado entre
tantas coisas e cheguei a conclusão que eu devo ser algum tipo de
idiota sem graça, nunca planejo ou faço algo estranho demais,
surpreendente pra depois ficar contando o ano inteiro. Desta vês
igual, com apenas uma diferença, sem namorada, mulher, amigos, nada,
somente tive uma ideia de ultima hora pra não ter que ficar fritando
o cerebelo vendo festa dos outros pela televisão e ouvindo a festa
do lado de fora estourando por todas as casas; Peguei a bicicleta,
mochila e comecei a pedalar, no começo ainda no meu bairro sem
direção depois tracei um plano de viagem na direção de Ribeirão
Pires uma cidade da região, pequena e com cara de interior, já
perto da Serra do mar.Uma cidade bonita e tranquila, com muitos
bares, vida noturna,então pensei... Deve ter uma grande festa de
rua lá. De Santo André até Ribeirão deve ter uns 20 Kms, fui
indo e quando encontrava alguma latinha vazia de cerveja, pegava,
amassava, colocava na mochila e seguia. Fui pedalando sem pressa,
vendo todo o clima de festa de outro modo, os carros indo com pessoas
empolgadas, muitas de branco, algumas casas preparadas com as pessoas
vestidas, taças, cervejas, um clima bom. Segui pela avenida que na
verdade se parece mais com uma grande estrada, em dias normais, de
dia sempre esta lotada de caminhões porque tem muitas industrias na
sua margem e é rota de ligação de SP com toda a região e
baixada Santista. Fui seguindo,nenhum louco pedalando, fora eu,
passei por Mauá e no trecho das grandes fabricas que estavam
fechadas, dava pra ver vês ou outra um vigia solitário, parecia
estar estranhando tudo quando olhava pela cabine pra fora; “Is
there anybody there”???. Cruzei com uma das entradas do Rodoanel,
fiz uma rápida parada para o banheiro debaixo do viaduto totalmente
vazio, enorme, muito espaço, terra vermelha amassada; Um ótimo lugar
pra uma grande festa com tochas, fogo, uma banda tocando algo mais
nervoso de Niel Young , Stones, Punk Rock, caipirinha, todos os
amigos que estão espalhados pelo planeta, os que já partiram também
e claro muita mulher bonita sem frescura, que não fique falando de
Shoppings, dividas do cartão, carro novo, simplesmente Rock' N Roll!
Tudo isto veio na minha mente nestes poucos minutos de uso deste
enorme banheiro sem nenhum sinal da presença humana. Hora de partir,
novamente na bicicleta, mais algumas latinhas pelo caminho, deixadas
pelo pessoal dos carros, algumas já muito amassadas, passei por Mauá
e fui pedalando na direção de Ribeirão Pires onde eu imaginava que
estaria lotado de pessoas na Praça e que teria a tradicional
contagem do tempo, muita musica, seria o meu ponto de parada pra
descansar e fazer parte daquilo, tomar algumas cervejas conversar com
desconhecidos que poderiam se tornar amigos e recolher algumas latas
vazias. O caminho teve trechos escuros, em algumas partes tive que
fazer malabarismos pelo espaço dividido com buracos e o rio do
outro lado, em algumas partes de calçada muita estreita tinha poste
bem no meio e acabei quase batendo em um deles, fora as grandes
subidas que com uma bicicleta sem condições de fazer o que eu
estava fazendo( a catraca e corrente muito gasta, pula bastante)
começou a ficar difícil estas subidas de mais de 500 metros, mas
depois tinha a descida, a recompensa, a festa.
Cheguei por fim em Ribeirão Pires,
depois de duas horas de pedaladas, cruzei os trilhos da velha estação
de trem e pra confirmar mais uma escolha errada, entre as milhares
que se somam por varias décadas, não tinha nada, tudo vazio, sem
festa, sem bar aberto; “Is there anybody there”??? Nada, somente
alguns cachorros, um ou outro bêbado e algum casal solitário. Uma
volta pela cidade fantasma, mais algumas latinhas pelo caminho pra se
somar e completar a minha meta de pelo menos 70 latinhas, o que me
daria a fortuna na venda de $ 2,20 e decidi voltar tudo pedalando e
talvez parar em Mauá se tivesse algo de festa na rua. Uma grande
subida pela frente, mais uma descida e uma parte plana com muito
verde dos dois lados, terra vermelha, alguns sítios e chácaras com
luzes e pessoas esperando dar 24 hs,as vilas distantes com alguns
fogos e de repente tudo explodiu, percebi pelos gritos e os fogos,
agora muito mais forte que havia chegado o novo ano. Atravessei com a
bicicleta para o lado esquerdo da pista, havia uma grande maquina,
escavadeira de terra parada, abandonada pelo menos por estes dias de
festas, terra mexida, um rio quase encoberto pela vegetação e uma
estrada de terra indo no meio do mato pra lugar nenhum. Ali me
pareceu o lugar perfeito e totalmente fora dos padrões normais pra
alguém estar passando a virada do ano, bom para escutar e ver os
fogos. O lugar na verdade lembrava locais onde abandonam pessoas
mortas, assassinadas, carros roubados, mas não tinha nenhum sinal de
algo ruim, nenhuma presença estranha, pelo contrario um lugar muito
bonito a noite. Parei com a bicicleta, do lado da maquina e do rio.
Havia um grande circulo sem vegetação, limpo pela maquina e dele
seguia a estrada de terra batida, estreita, para o mato. Os fogos estouravam de vários
lados , longe e dava pra perceber pelas luzes que os focos eram de
varias comunidades, vilas. Apesar de eu não ter o mesmo fascínio
que a maioria das pessoas tem por estes brinquedos, o jeito e a
distancia que estouravam, se intercalando, se juntando, vários sons
distantes, depois tudo no mesmo tempo, parecia uma orquestra, com um
solo do trem que cruzava cheio de luzes e apitando, vindo de São
Paulo para Ribeirão Pires, um concerto para 2013. Fiquei parado olhando e ouvindo tudo
aquilo e de repente percebi que naquele momento eu estava no melhor
lugar, não precisava de nada, só havia conseguido sentir isto
quando viajei por muitos dias em estradas de Minas Gerais ou pelo
deserto do Atacama no Chile. A única coisa que me passava pela
mente, fora este bem estar, sem ansiedade, sem abraços, palavras,
sem copos, salgados, carne, euforia era a lembrança dos amigos e
pessoas da família, também das pessoas que já morreram, mas isto
também veio de uma maneira leve e desejei sorte pra todos e seguimos
na contemplação, porque também havia uma sensação de estar
acompanhado ali, o contrario de algumas vezes no meio de um monte de
gente que eu procurava um outro canto pra sair um pouco pois não
estava conectado com as pessoas. Mais um pouco de fogos e apareceu um
monte de gente e crianças de branco na beira da estrada, devem ter
saído de uma chácara, gritando feliz ano novo para os carros que
passavam.Entrei mais pra dentro da estrada e fiquei até os fogos ir
parando. Olhando ao redor, percebi que havia um morro e em cima uma
pequena Igreja, quase tampada pela mata. A Igreja se não estou
enganado deve ser a Igreja do Pilar de Ribeirão Pires; Uma Igreja
pequena e simples mas com grande significado para muitas pessoas e
turistas que a visitam e pra mim agora todo este lugar junto com a
igreja virou um local magico, sagrado, não teria como eu planejar
tudo como aconteceu, tudo foi perfeito, mesmo sem pessoas,
gargalhadas, copos e promessas, sem aquela pessoa especial que toda
mundo quer ter ao lado nestas horas, desta vês nem nisto eu pensei.
Depois de um bom tempo resolvi pegar a
estrada de volta pra casa, pegando latinhas, passando ainda por Mauá
e por fim chegando a Santo André as 3 hs da Manhã com quase câimbra
e umas 70 latinhas vazias de cerveja. Quando sai nesta pequena viagem
eu não tinha ainda um plano traçado, um trajeto, só queria fugir
um pouco das festas dos vizinhos e pegar algumas latinhas, mas aquilo
foi se tornando uma das melhores partes com significado da minha
vida. Pedalar 40 Kms não é nada, tem muita gente que faz muito mais
que isto todos os dias, mas o importante é que esta
“viagem”funcionou, como abrir mais uma vês aquela porta que esta
ali, mas a gente acaba esquecendo, um tipo de encontro com você
mesmo pra realmente mudar mais uma vês aquilo que não esta
funcionando e fazer a sintonia com o que é mais importante; A vida,
a liberdade. Nós perdemos muito tempo fazendo coisas e justificando
atos e convenções sociais na maioria das vezes por medo mesmo
porque o caminho da verdadeira satisfação, a sua, não a dos outros
ou a que indicam pra você a vida inteira não é uma coisa assim tão
fácil, mas ...Eu gosto disto, como aquela musica dos Stones; "It's
Only Rock'n
Roll
(But I Like It)"
As latas que consegui, 70, $ 2,20... A
parte pratica desta viagem, materialista, financeira é só mais
uma história minha de fracassos neste lado necessário da vida. Eu
teria que ter ido na verdade pro centro de São Paulo, onde os
“profissionais” das latinhas enchem vários sacos com tanta gente
bebendo. De qualquer maneira tudo é uma questão de aplicação de
matemática; Se você conseguiu 70 latinhas então pode trabalhar
muito mais e pegar 7000, depois consegue um caminhão e começa a
comprar algumas toneladas explorando pessoas"escravos" que pegam pra você e vender pras grandes recicladoras de
alumínio. Ou melhor ainda, juntar algum dinheiro pegando latinhas e
investir nas ações das Empresas dos “Grandes Catadores de
Latinhas S/A”...
Feliz Ano Novo
Vanderlei do Prado
Fotos/ Google
O trecho foi feito a noite as imagens deste trajeto são de dia porque peguei no mapa do Google, o viaduto por exemplo, "salão de festas" estava bem melhor que esta imagem, maior.
Fotos/ Google
O trecho foi feito a noite as imagens deste trajeto são de dia porque peguei no mapa do Google, o viaduto por exemplo, "salão de festas" estava bem melhor que esta imagem, maior.
Ponto de partida/minha casa a esquerda |
Trecho em Maua |
Grande sala de festas, a noite é mais bonito |
Maua |
Estação de Ribeirão Pires |
Subidas de Ribeirão |
Calçada com poste bem no meio |
http://www.ribeiraopires.sp.gov.br/interno.php?id=359 http://ribeiraopires.fot.br/Historia/001-PILAR_PARTE_02.htm |
Local onde parei a noite. Depois da ponte entrei pra dentro do lado do rio, era tudo terra e tinha uma escavadeira. Estas fotos que peguei do mapa do Google são de 2011 ou a Prefeitura esta tirando tudo isto que não tinha quando estive lá a noite do dia 31, estacionamento, calçada, vou verificar isto ou algo de estranho aconteceu neste lugar.
09 de janeiro de 2013- Voltei ao lugar e na verdade esta havendo uma obra ao lado do estacionamento. O lugar é o Morro de Santo Antonio, um mirante e não a Igreja de Nossa Senhora do Pilar.
Todos estes lugares valem a pena serem visitados, principalmente pra quem gosta de fazer pequenas viagens de bicicleta. Se a pessoa estiver preparada pode ainda esticar para Rio Grande da Serra, Paranapiacaba, ou até mesmo descer para o litoral. Esta parte já exige mais de quem resolver esticar a viagem. Precisa ter tempo, preparo fisico e equipamento
09 de janeiro de 2013- Voltei ao lugar e na verdade esta havendo uma obra ao lado do estacionamento. O lugar é o Morro de Santo Antonio, um mirante e não a Igreja de Nossa Senhora do Pilar.
Todos estes lugares valem a pena serem visitados, principalmente pra quem gosta de fazer pequenas viagens de bicicleta. Se a pessoa estiver preparada pode ainda esticar para Rio Grande da Serra, Paranapiacaba, ou até mesmo descer para o litoral. Esta parte já exige mais de quem resolver esticar a viagem. Precisa ter tempo, preparo fisico e equipamento
http://www.youtube.com/watch?v=LQ123T3zD2k/ Neil Young
http://www.youtube.com/watch?v=PdiCJUysIT0/ Neil Young
http://www.youtube.com/watch?v=PdiCJUysIT0/ Neil Young
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